domingo, 21 de agosto de 2016

O clinch no Muay Thai



A técnica de clinch no Muay Thai é algo bastante discutido e ainda pouco compreendido na sua completude, visto que sempre há relatos de lutadores que foram a Tailândia e voltam falando das dificuldades técnicas encontradas lá, onde o clinch é a principal delas, tanto em conhecimento quanto em quantidade de treinos.

Ficou bastante comum no Brasil o ensino de MuayThai com utilização de técnicas apenas de socos e chutes e algumas joelhadas – mais utilizadas nas regras do K-1 -, a técnica de clinch mais utilizada era a padrão K-1, com duas mãos atrás da nuca adversária e joelhada subindo para atingir o rosto ou o diafragma, limitando muito o uso da técnica que é praticada na Tailândia.

O clinch é algo muito rico e indicarei alguns vídeos que mostrem princípios básicos que ajudem a entender um pouco mais o que é fundamental para se começar a ter uma boa técnica de clinch e aumentar o leque de conhecimentos sobre essa e outras técnicas fundamentais dentro do MuayThai.

O MuayThai no modo pelo qual é praticado na Tailândia possui algumas características bem específicas que é diferente do que estamos acostumados no lado ocidental do planeta, desde a pontuação, o estilo, o que é visto e o que é considerado principal em um guerreiro e em uma luta.

Como já foi disto na publicação sobre postura, a base é algo fundamental, e como o julgamento se baseia em quanto o lutador é forte, ele tem que ter uma base firme, independente da sua movimentação, não pode acusar que desequilibrou ou sentiu o golpe adversário. Além disso, a postura das técnicas tanto de ataque quanto defesa precisam estar no esplendor. Numa peleja o lutador tem que machucar o oponente, ou seja, os golpes precisam ser lançados com força, para que o adversário sinta o golpe lançado. A força e técnica são importantes mas o coração é algo levado em conta também, onde o lutador pode virar uma luta, ou mesmo quando cansado consegue se sobrepor ao outro e no fim da luta mostrar mais garra. Existe eventos que ainda pontuam para o lutador que anda para frente, indicando que ele está melhor na luta e está buscando mais o combate, diferente de quem está andando para trás, quase que correndo da luta. É desse princípio que o clinch sempre ocorrerá em uma luta na Tailândia.

Para mais informações em português sobre MuayThai, conhecimento de lutas, regras, técnicas e lutadores há o acervothai e o yoksutai.

Da forma que é praticado na Tailândia, normalmente não há grande movimentação durante uma luta, os lutadores costumam sempre andar para frente em busca da peleja e de machucar o oponente. Só que em uma luta onde dois adversários andam para frente, uma hora a distância será tão curta entre eles que o que resta é partir para o clinch.

Partindo da ideia básica, vou partir do início, a base. No clinch, os pés ficam paralelos, não em postura diagonal como durante o restante do combate. Os calcanhares se elevam e fica-se apoiado na semi-planta do pé, como modo de mostrar equilíbrio e imposição na postura sobre o oponente. O quadril é jogado para frente, colando o corpo ao do outro e buscando o controle, anda-se para frente, tentando fazer com que o adversário ande para trás e seja controlado nessa posição.



Figura 1. Atenção aos pés do atleta de vermelho, postura de quem domina o clinch e se impõe ao adversário.


No vídeo é possível vermos várias técnicas e é bom assistir vários deles, mas logo no início vemos a postura dos pés e quadril indicado, o que ajuda também movimentações laterais, rotações buscando quedas ou desequilíbrio adversário. O clinch trata de dominação, imposição e desequilíbrio. Corpos eretos mostram controle, domínio e sobrepujança de um lutador sobre outro.
Como é uma técnica aplicada em uma peleja, não adianta apenas a disputa pelo ganho dos braços, mas a aplicação de golpes, sendo joelhadas contínuas e possíveis cotoveladas. O método de entrada é dos mais variados tipos, desde fintas com socos para uma mão e depois outra, como fintas de joelhadas para diminuição da distância, etc. Após o início do clinch, busca-se travar os bíceps alheio com o objetivo de evitar possíveis cotoveladas e mostrar uma forma de controle sobre o adversário.



Figura 2. Controle dos biceps para evitar entradas de cotovelos, onde o dano é muito grande e a distância é propícia a estes golpes.



Após a postura bem firme, há a disputa de controle de braços e início de sequências de joelhadas, onde quem recebe as joelhadas não pode acusar que sentiu o golpe e tem que continuar buscando o controle do clinch e o lançamento de joelhadas (empurrando, não apenas subindo) para machucar o oponente.


Figura 3. Melhor forma de aplicar uma joelhada na região abdominal, empurrando e projetando o quadril para frente, dando maior potência para o golpe “entrar”.

Há quem diga que o clinch não é uma luta, é como uma dança. Como um combate do Muay Thai ocorre sempre ao som da sarama – a música tradicional tocada durante as lutas – o momento do clinch é quase como uma dança a dois, onde a situação de domínio pode ser vista como uma condução do parceiro.


Figura 4. Combate um dança a dois?


O clinch serve tanto para ataques quanto para quedas, e uma queda é o sinônimo que você é mais forte e mais equilibrado que seu oponente, levando vantagem em uma luta quando há quedas. Mas que fique claro: Muitas quedas pode ser visto pelos juízes um modo de você fugir da luta, com medo de ataques etc.

Diferente de um combate onde só há troca de golpes, onde há momentos de explosão e relaxamento durante a peleja, no clinch há troca constante de força e isometria, ainda ocorrendo a explosão no lançamento de joelhadas e cotoveladas potentes.


Figura 5. Tirando a potência da joelhada do oponente empurrando-o pelos ombros, não deixando que seja dominado pelo clinch adversário.


Inicialmente é isso, depois falarei um pouco mais sobre as técnicas de braço, as disputas, as semelhanças e diferenças entre outras técnicas de lutas agarradas e vantagens e desvantagens, além de um pouco da origem destes conceitos. Assista quantos vídeos puder prestando atenção nos detalhes, desde postura, disputas e truques, como o uso da cabeça para incomodar e trava de braços.


Figura 6. Bloqueio do quadril adversário.

Tem um artigo muito bom do 8limbs falando sobre Tanadet Tor. Pran49  sobre a técnica utilizada pela sua academia, no qual não há essa postura ereta, já que o tipo de trava exige uma inclinação do tronco. Dá uma olhada.


quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Go no sen, Sen no sen e Sensen no sen




No Caratê, como em grande parte nas artes marciais orientais, o combate acontece sempre em etapas, e a primeira delas é a mental. Uma luta só pode ser vencida se a vitória acontecer na mente, se o vencedor tiver a força e a estratégia pronta com a certeza que ocorrerá o que ele planejou. O verdadeiro vencedor é aquele que conseguir realizar o que a mente previu.
No Japão fala-se muito do Zen, um estado mental de completa limpeza, concentração e foco. Monges usam-no em estado meditativo mas sua prática pode ocorrer em ações da vida diária. No mundo da luta, o estado de Zen é exatamente o momento que a cabeça do lutador encontrar-se-á pronta para ler a situação, o adversário e, conhecendo suas capacidades e habilidades, fará o movimento correto, sendo de bloqueio, ataque ou contra-ataque.

“Golpear com precisão não é o mesmo que acertar um golpe. Seja qual for o tipo de ataque, a pessoa deve antes determinar como será o golpe e depois executá-lo exatamente como planejou. Por outro lado, acertar um golpe não é nada mais do que isso, mesmo que ele seja forte o bastante para matar o adversário. Golpear com precisão significa definir mentalmente o golpe que irá se aplicar e colocá-lo em prática assim como foi planejado.”
Miyamoto Musashi, O livro dos cinco anéis.





Sabendo da importância deste aspecto, falemos da parte técnica. Durante o Kumite (parte de combate do caratê), há maneiras de tomar a iniciativa onde usa-se um conceito denominado Sem. Ele é dividido em Go no Sen, Sen no Sen e Sensen no Sen. Falar destes aspectos é já partirmos para a situação de combate propriamente dita e é dela que vamos tratar.



Go no sen.



Tecnicamente o Go no Sen é o ato de bloquear o ataque adversário e contra-atacá-lo. No sentido mais amplo, refere-se ao ato de não iniciar o ataque, vencer a disputa esperando a iniciativa do oponente, usando o bloqueio e contra-atacando na brecha deixada pelo adversário.


O Go no sen é muito utilizado no combate, mas a força mental da aplicação do mesmo advém da preparação para o bloqueio e contra-ataque. Tendo noção do ataque desferido pelo oponente, parte-se para o bloqueio já sabendo qual ataque utilizar, qual espaço para o ataque o seu bloqueio irá criar. Tudo isso é pré-definido mentalmente, mas ao mesmo tempo é criado no momento, visto que o adversário irá definir qual bloqueio será executado.





Sen no Sen


O Sen no sen configura a ação pura do contra-ataque. Após o oponente desferir o golpe, toma-se a ação de contra-atacá-lo no espaço desprotegido do adversário. A força mental vem junto com a prática e o curto tempo de resposta, responsável pela leitura dos movimentos do oponente e reação com ataque. O Sen no sen também exige que o contra-ataque ocorra de tal forma que não se sofra o ataque inicial, podendo ser executado junto a uma esquiva ou de um modo que o contra-ataque se sobreponha ao ataque adversário.
Uma diferença entre o Go no sen e o Sen no sen é que lutadores contra golpeadores esperam o ataque do oponente, bloqueiam ou esquivam e aí tomam a atitude de atacar. Isso corresponde à prática do Go no Sen. Quando o golpe for lançado e o lutador avançar para atacar ao mesmo tempo, atingindo e em consequência disso, fazendo o contra-ataque se sobrepor ao ataque, isso é a essência do Sen no sen.





Sensen no sen



O Sensen no sen é o caso mais emblemático. Este tipo de ação durante o Kumite ocorre para praticantes de muitos anos em uma arte marcial. A grosso modo, o Sensen no sen é a ação de antecipar o movimento do adversário, atacando-o primeiro. Esta iniciativa é de uma sutileza muito grande, pois não é fácil perceber a diferença entre apenas atacar o adversário e antecipar o ataque do oponente atacando-o, e este ataque fazendo com que o golpe adversário não seja lançado.
Perceber e executar o Sensen no sen é uma questão de anos de prática, tanto para a execução quanto para conseguir perceber essa diferença durante o Kumite. A força mental tem que ser no mais alto nível, pois se faz necessária uma leitura dos movimentos e intenções do oponente e saber qual o momento para o golpe, além de qual o melhor golpe para a ação do Sensen no sen.


Durante este clássico do MMA, Anderson Silva utiliza bem as três iniciativas.





Durante um combate, o tipo de iniciativa para conseguir atingir o oponente fica a critério do aprendizado, das práticas adquiridas e do preparo técnico, físico e mental do praticante das artes marciais. Todas as iniciativas descritas acima possuem sua eficácia se bem utilizadas. Excetuando o sensen no sen, as outras podem ser utilizadas com uma certa prática da arte. O Sensen no sen exige um maior tempo de dedicação e prática, muitos kumites e estudo, além da visão do contexto da luta que é adquirida com a experiência.